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A favela (ainda) não venceu


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Nesses últimos tempos, tem sido cada vez mais comum escutarmos de artistas pretos e periféricos a frase “A favela venceu”. Entendo que, por um lado, seja importante trazer este marcador para a mídia como uma forma de enaltecer aqueles que vêm de uma realidade que, apesar de dura e de exclusão social, conseguiram alcançar voos mais altos. No entanto, é preciso que sejamos mais cautelosos com essa afirmação, pois grande parte da população que habita nesses lugares ainda está longe de vencer a batalha contra o racismo e a desigualdade social.

Dados mais recentes, estudados pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), calculam que 70% do grupo abaixo da linha da pobreza é composto pela população negra. Quando o assunto é educação, esse número, não muito surpreendentemente, permanece bastante semelhante. Negros e pardos totalizam 71, 7% dos jovens que abandonam a escola, sendo que a taxa de analfabetismo é três vezes maior para este mesmo grupo. Com o avanço da pandemia do covid-19 e o isolamento social, fazendo com que muitos jovens tivessem que estudar de forma remota, este número certamente não teve uma diminuição, visto que as camadas mais populares sofreram muito com a falta de recursos das escolas públicas e o descaso do governo para com a educação.

Esses dados não são o resultado de algo aleatório. Historicamente falando, o Brasil sempre tentou, de diversas maneiras, rebaixar ou até mesmo tentar eliminar a sua população negra. São muitas as tentativas que podemos incluir, desde o processo de escravização e desumanização dos nossos, até mesmo o período em que a intenção era eugenizar o povo brasileiro. Esta, não muito distante da realidade atual, tinha como premissa a erradicação de todos aqueles que não se enquadravam no padrão da branquitude, por isso tivemos por um bom tempo a imigração de italianos e alemães, subsidiados pelo próprio governo brasileiro. Assim, com a sua chegada, a população negra foi, aos poucos, sendo retirada dos centros urbanos e colocada nas periferias ou morros, onde, até hoje, vive, na sua grande maioria, sem o olhar do estado e sem os cuidados mais básicos para a sua sobrevivência.


Tendo em vista esses apontamentos, pode-se dizer que pelo prisma da construção de representação midiática e de pessoas que sejam referências para crianças e jovens negros, é bastante interessante que muitos artistas, personalidades e profissionais prestigiados de várias áreas sejam pretos. Eles estabelecem para as novas gerações um novo padrão que não está apenas vinculado a algumas profissões e formas de viver, como antigamente era destinado a nós. Embora ainda estejamos em um país racista, que insiste na narrativa hipócrita da igualdade racial, eles possibilitam que todos possamos sonhar com um futuro muito mais plural e diverso, quebrando as barreiras e criando novos caminhos. No entanto, mesmo que isso seja um grande feito para nós, em termos de coletivo não podemos dizer, ou acreditar, que conseguimos vencer todos os obstáculos sociais designados a nossa população. A favela ainda continua desassistida, as pessoas negras continuam, dia após dia, sendo encarceradas nas prisões e sendo brutalmente assassinadas. Mulheres pretas se mantém na base da pirâmide, recebendo menos e com menor prospecção de crescimento profissional. Homens negros permanecem sendo dizimados pelo genocídio e tantas outras micro agressões do cotidiano continuam avançando em direção aos nossos.

Portanto, mesmo que seja um deleite, em meio a tanta violência pela qual somos acometidos, dizer que a favela venceu não nos ajuda a tracejar, de fato, um ambiente de amenidades para as pessoas negras. Isso porque as vitórias individuais não constroem um ambiente coletivo de equidade e segurança. É preciso que, para além das conquistas esparsas que acompanhamos pela tv ou internet, possamos ter um país que valorize a cultura negra e que promova condições de crescimento e desenvolvimento para as camadas mais populares, exatamente onde estamos mais inseridos. Para isso, políticas públicas são necessárias, uma vez que elas vão ao encontro da expansão e progressão das oportunidades. Dessa forma, aquelas pessoas que realmente vivem e ocupam as favelas poderão, por certo, em um futuro, dizer que venceram, a partir de uma perspectiva do coletivo.

 
 
 

2 comentários


Vukinha
12 de abr. de 2023

olá professor sou eu Wesley eu li todo seu texto e gostei dele muito ficaria muito feliz caso você lesse ele para turma eu estou usando a conta da minha tia para mandar essa menssagem

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annavolkweis
09 de jan. de 2023

👏👏

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