Cegueira coletiva
- gustavorodrigues937
- 28 de nov. de 2021
- 2 min de leitura

Faz tempo que firmamos um pacto de cegueira coletiva. Sabemos o que está acontecendo, mas a tranquilidade das nossas vidas não pode ser perturbada pela realidade diante de nossos olhos.
Andar pelas ruas de Porto Alegre, ou de qualquer cidade um pouco mais desenvolvida, tem sido um grande obstáculo para esse acordo social. Não tem sido nada fácil despistar de pessoas em situação de rua e depois ter a delicadeza de frequentar um restaurante e se fartar de uma comida relativamente cara. Tem sido complicado dirigir pelas ruas da capital e, a cada semáforo, desviar o olhar de crianças pedintes, tentando apagar a sua voz aumentando o som do rádio que está sendo controlado pelo bluetooth do iPhone. Ignorar que talvez essas mesmas crianças sejam aquelas que em suas casas (caso morem em algum lugar) apenas dispõem de uma refeição ao dia está sendo uma tarefa árdua. Aprendemos também, mais recentemente, a entender que a morte das pessoas é algo muito banal, mesmo que tenham sido inúmeras através de uma doença que poderia ter sido combatida com mais seriedade. Então, quem se preocuparia com a vida dessas pessoas invisíveis? Por falar em invisibilidade, certamente entraria para o grupo dos ignorados a vida das pessoas negras. Afinal, a quem importa?
A questão é que nos deixamos contaminar pela banalidade da vida. Esquecemo-nos de ser gente, de sentir, de se comover, de se mobilizar. É muito mais fácil e conveniente fingir cegueira. Fingir que estes acontecimentos não nos competem ou não fazem parte de nossas vidas. Normatizamos as violências diárias que ocorrem com os outros como uma forma de nos isentarmos de um compromisso que também é de nossa responsabilidade. Não é certo aceitarmos que exista fome, principalmente em um dos países que mais produz alimento. Não é normal acreditarmos que as pessoas estejam em condições precárias unicamente porque não se esforçaram. A meritocracia não deveria estar presente em nosso vocabulário quando o assunto é pobreza, e, honestamente falando, nas condições em que vivemos, talvez ela nunca deveria nem passar pela nossa cabeça. É insensível demais vermos tudo isso de camarote e não fazermos nada. Não dá mais.
No entanto, continuamos aqui com nossas vidinhas de classe média. Indo a restaurantes e aos parques da cidade e assistindo de nossas torres de isolamento o grande espetáculo da vida que nós mesmos criamos. Ou você ainda se acha isento de tudo isso?




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